A mente
Às vezes
Temente
Esconde
Da gente
Memórias
Pendentes
Entrementes
Hiatos
Silentes
Calados
Correntes
Castigo
Doente
Autor: Fido do Carmo
Sejam bem-vindos ao meu balbucio poético, isto é, às minhas tentativas de fazer dos meus sentimentos e dos pensamentos matéria-prima para a poesia.
A mente
Às vezes
Temente
Esconde
Da gente
Memórias
Pendentes
Entrementes
Hiatos
Silentes
Calados
Correntes
Castigo
Doente
Autor: Fido do Carmo
Passarinho
Queria ser um passarinho
Pra ser empurrado do ninho
E incentivado a sozinho voar
Queria ser um joão-de-barro
Pra me ocupar com um belo trabalho
Que eu próprio iria aproveitar
Queria ser um beija-flor
Pra viver pairando sob o sabor
E do néctar doce me deleitar
Autor: Fido do Carmo
Ah! A tempestade quando chega
Molha e desfaz aquela quase certeza
Carrega tudo que, frouxo, vagueia
No chão da existência, arrasta a correnteza
Autor: Fido do Carmo
O trabalho das mãos na labuta
Sol a sol não é nenhum castigo
É dádiva em ter a terra sonhada
Pra cultivar o sustento bendito
Até mesmo as ervas daninhas
E as pragas que estão no caminho
Ensinam-nos a vencer as agruras
Que traz o mundo, o grande moinho
A espera também muito ensina
Do plantio à colheita, o cuidado
Hora certa da rega e da poda
Pra colher sem que tenha tardado
E no prato servido à mesa
Bem temperam as mãos calejadas
Com o sabor do suor da peleja
Torna as almas regozijadas
Autor: Fido do Carmo
Há dias em que a noite me
apetece
O seu silêncio ruidoso de
mistérios
E o céu em breu polvilhado
de brilho
Guiam-me pra além do planisfério
Nesses dias tudo fica lúcido
As certezas atravessam o
lamento
Revestindo-se de siso e firmeza
Levam-me ao bom discernimento
Até as incertezas mais perenes
Dão trégua por um breve instante
Tudo parece tão clarividente
Calculadamente
equidistante
As luzes em meio à
escuridão
São o rumo que eu tanto
preciso
Pra clarear a neblina de
angústias
E transbordar o melhor do meu riso
Autor: Fido do Carmo
Soprou um certo vento bom
Refrescante tal hortelã
Com força pra levar o mal
Pairado sobre o meu clã
Brisa que areja a paz
Faz o trabalho de artesã
Com esmero e fineza
Modela a minha mente sã
Como Éolo vou fazer
Guardar a brisa pra
amanhã
E se aquele mal brotar
Farei do vento o meu divã
Autor: Fido do Carmo
Sonhei com um pomar de poemas
Todo dia brotavam novos versos
Sempre colhia os mais maduros
Eram sobre os temas mais diversos
No sonho, o pomar era balsâmico
Uma mistura de flores e frutos
Enfeitava e alimentava a casa
Saciando com belezas e usufrutos
Acordei e, logo, olhei no quintal
Lá estava apenas o velho pomar
Mangas, jaboticabas e pitangas
Exalando como um belo manjar
Os poemas não estavam por lá
A procura me levou a pensar
Que o pomar muito ajuda a criar
A depender da forma de olhar
A poesia não dá como fruta
Nasce e se faz no enlace do amar
Em terra adubada pelo sentir
Brota a vontade de declamar
Autor: Fido do Carmo
Sai do sereno, Serena
Disse a dona bonita
Seduzida pela rua
A gata no sereno fica
Desce do muro, Serena
Disse à gata zureta
Preocupada com a gata
A tutora faz careta
Entra pra casa, Serena
Insiste a tutora bendita
A gata hipnotizada
Só vê o que lhe cobiça
Venha comer, Serena
Abre o patê pra gatita
Sai do sereno correndo
E avança sobre a comida
Autor: Fido do Carmo
Minha tez que exalava poesia
Hoje sofre com a pura teoria
Se o conteúdo é duro como pedra
A forma carece de ser tão severa?
Autor: Fido do Carmo
O que eu sei é tão pouco
O que não sei, quase tudo
Esse todo aumenta muito
A cada átimo de segundo
Eu busco, ando e luto
Mesmo se corresse sozinho
Ainda seria pouco... louco
Se a febre do saber me toma
Na alteridade eu mergulho
Arrefece o calor interno
Pois tudo que não sei
Asas da paz
Asas de conforto, envolvam-me!
Penas brancas de suave
toque
Aqueçam-me no teu colo brando
E embalem o meu sereno sono
Autor: Fido do Carmo
O ontem, foice afiada do
tempo
Que cortou aquele possível
momento
E ceifou a lembrança do
que não se viveu
Autor: Fido do Carmo
Onírico
Minhas noites parecem
jogos
Conduzidos pelo subconsciente
Com charadas embaralhadas
Que ficam dias na minha
mente
Alguns deles desaparecem
Tão logo eu me desperte
Até tento voltar ao sonho
Mas o espírito segue inerte
Oh! Morfeu, deus dos sonhos
Mande-me formas inteligíveis
Que revelem o caminho
Desses enigmas inacessíveis
Os cenários arquitetados
Dos meus sonhos mais bizarros
Poderiam gerar belezas
Tal Dalí, Frida e Picasso
Mas tudo é tão insólito
Desmorona e me aflige
Nem Freud tá dando conta
Dos enigmas da Esfinge
Oh! Morfeu, deus dos sonhos
Mande-me formas inteligíveis
Que revelem o caminho
Desses enigmas inacessíveis
Devir
Daqui pra frente
Só quero vida, amor e revolução
E que as dores do passado
Fiquem como um denso manto
De cicatrizes marcadas e
mortas
Daqui pra frente
Que venham as dores novas
Pois tenho o coração preparado
Com um escudo duro, casca
grossa
Formado com cicatrizes
sobrepostas
Daqui pra frente
O passado calará o grito.... silenciará
O medo será atropelado
pelo tanque
Da vontade de viver tudo o
que é ser
Porque o devir é o meu grande trunfo
Autor: Fido do Carmo
Sau
da
de
Palavra-igreja
Que congrega a falta
Do bem que se foi
Que reza a lembrança
Do gozo de outrora
Autor: Fido do Carmo
A morte do sim
Há de florescer o melhor
de mim
Nem que para tal eu
decrete o fim
Da minha porção que
sempre diz sim
Às vezes o não, parece
ruim
Mas ele é vital, é bem, outrossim
Vou tirar as ervas daninhas
do sim
Quais flores nascerão no
meu jardim?
Será que o meu melhor cheira
a jasmim?
A morte é a vida da cor
carmim
Autor: Fido do Carmo
Quintal da bicharada
Uma gatinha malhada
Pulou no meu quintal
Subiu no pé de manga
No encalço do pardal
A gatinha acinzentada
Residente do local
Animou-se e se pôs
A subir de modo igual
Um cãozinho peludinho
Dono da jurisdição
Revoltou-se com o agito
Começando a confusão
O alvoroço inusitado
Despertou a atenção
E o pardal ergueu voo
Fugindo salvo e são
Lá do alto, o passarinho
Sentindo a tranquilidade
Cantou forte o deboche
E voou em liberdade
Autor: Fido do Carmo
Chuva de primavera
Oh! Chuva de primavera
Umedece a minha terra
Que a seca prisão do outrora
Inunde com as águas do agora
Autor: Fido do Carmo
Tempo. Temporal de horas duras.
Chove forte e eu sem guarda-chuva.
Dura. Dureza tempestiva e crua.
No solo teso evapora a ternura.
Autor: Fido do Carmo
Vilarejo
Sinto-me preso no sopé de uma montanha
No vale, a força catabática frustra a subida
Mas crio asas e plaino nesta forte ventania
Esperançando luto pelo enleio da partida
Escudo-me no colo da elevada cordilheira
Como águia, fito o topo e empenho-me no desejo
De alcançar as alturas da visão emancipada
No horizonte, o vento bom daquele vilarejo
Projeto-me aos solos de uma nova geografia
Onde as asas são livres do tempo-dinheiro
E a existência é enfrentada com dignidade
Sem grilhões, as plantas dos pés geram viveiros
Tronos
Há tronos sem majestade
Onde todos são quase iguais
Na louça branca ou bege
Do Shopping e dos
terminais
Na hora do desespero
Ninguém escolhe o assento
Quando chega sem
sobreaviso
Faz perder o
acanhamento
A posição comum a todos
Prostrados na defensiva
No alarido e sob o aroma
Da assentada meditativa
Autor: Fido do Carmo
Há de surgir
Há de surgir um abrigo seguro
Cercado de fossos profundos
Com adarves e altos muros
Tão fortes que impedem o abuso
Do intruso poder iracundo
Que cega e faz tudo imundo
Há de surgir um sorriso largo
Faceiro como enredo criado
Com a trilha dos Novos Baianos
No embalo de braços amados
Com ébrios afetos forjados
No brasido dos enamorados
Autor: Fido do Carmo
Pobre poema
Há dias em que tudo seca
Lágrima, sorriso e poema
Aonde outrora transbordou
Nada, por mais que esprema
Tento, esforço-me a sentir
Coloco-me aberto ao dilema
Com o riso e o olhar ressequido
Só me resta este pobre poema
Autor: Fido do Carmo
Mar da existência
A calmaria do alto mar é momentânea
O tempo de tormenta sempre espreita
Atrevo a desbravar o mar da existência
Com o barco tímido de proa bem feita
Mas o leme as vezes pesa tanto, tanto...
Segurá-lo firme na tormenta é resistência
Num esforço vívido busco manter o fito
E impedir o desvio da bússola da sapiência
No limite da sobrevivência do amigo siso
O sopro brando da brisa marinha regressa
Nesse ínterim, refaço-me e ergo o espírito
A alma, por pouco tempo, descansa sem pressa
Autor: Fido do Carmo
Alvorada
desejosa
Noites frias
esquentadas pelas pernas quentes
Pelo afago do colo fragrante
e candente
Que me levanta em
plena alvorada fria
Aquecido pelo desejo
de desfrutar da tua chama
O fim do inverno se anuncia
Ah, primavera!
Já é sentida no calor
das tuas belas pernas
Autor: Fido do Carmo
(feito no fim do inverno de 2022)
12 versos de saudades
Saudades dos tempos do dia inteiro na rua
De passar as manhãs jogando bola de gude
Dos manjares grátis dos pomares da estação
Da corrida pelas trilhas para o banho no açude
Do antes, do durante e do depois do futebol
De contar e se orgulhar das pilhérias épicas
De ficar o dia inteiro descalço sob a luz do Sol
Da época de soltar pipas e papagaios no céu
Da energia de viver correndo sem se cansar
Das feridas das quedas ser tratadas como troféu
De cada melhor amigo de toda cidade deixada
Lembranças da infância que aquecem a alma
Autor: Fido do Carmo
Eu Sísifo
Todo dia a pedra rola
Não tem hora prevista
Por vezes, rola a noite
Outras, na luz do dia
Empenho toda energia
Empurrando morro acima
No cume quase vencido
A força contrária intima
Recomeço é o meu nome
De sobrenome esperança
Caminhando com fé na vida
Do castigo faço mudança
Cada vez que tento subir
Algo em mim se modifica
As pernas ficam mais firmes
E a mente se purifica
Autor: Fido do Carmo
Tons do Brasil
Nem todo verde é belo
Uns são força bruta
Outros, deserto
Nem todo amarelo é riqueza
Uns são doenças
Outros, avareza
Nem todo azul é celeste
Uns são fome
Outros, sangue
Nem todo branco é entendimento
Uns são vileza
Outros, esquecimento
Autor: Fido do Carmo
O vácuo da mão estendida
O rigor dos lábios cerrados
O sisudo olhar inclinado
No silêncio do tom desagrado
Tal qual Górgona da mitologia
O olhar quer fazer virar pedra
Os sentidos e as almas singelas
Faz arder como o frio da Sibéria
Mas onde o amor é brasido
Sobrepuja o olhar aquecido
E com calma e certeiro altruísmo
Regenera o afeto perdido
Gira
Gira Terra, gira mundo
Giram astros, gira tudo
Gira roda, gira vida
Giro alegre e sisudo
Gira Sol, gira estrela
Girassóis, luz que gira
Giravolta, volta e gira
Gira noite e dia
Abram as janelas da alma Destranquem vossos corações Que o frescor da brisa praiana Tire o peso das más condições Que a beleza suplante a...